Corrupção e Direitos Humanos

A corrupção eleitoral revelada pela Lava Jato e os direitos políticos no Brasil

Por Michael Freitas Mohallem

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Os efeitos da corrupção podem ser sentidos de diversas formas nas sociedades contemporâneas: na atividade econômica, no acesso a direitos sociais e nos processos democráticos. No Brasil, o principal elemento do debate público é a ineficiência do sistema de justiça. São comuns as referências à impunidade -- materializada no baixo o índice de condenações criminais -- como grande responsável pelo fracasso na luta contra a corrupção.

Segundo essa visão, as reformas legislativas recentes teriam oferecido novos e mais eficazes instrumentos de investigação às polícias e ao Ministério Público, mas não teriam enfrentado a lentidão e a incapacidade de punir do judiciário brasileiro. A percepção popular que parece prevalecer no país -- e claramente manifestada durante o processo eleitoral de 2018 -- é que a prática da corrupção, associada à impunidade, consolida-se como elemento de imobilidade da política, de freio da mudança e de bloqueio ao acesso de novos agentes políticos supostamente capazes de atuar com integridade. A não punição dos agentes políticos que competem em vantagem no processo eleitoral, com recursos ilegais, levaria a sua perpetuação como parlamentares eleitos, ou ao menos como candidatos com maior chance de sucesso.

Embora a ênfase no papel do judiciário como garantidor da integridade política denote expectativa possivelmente exagerada sobre o papel das instituições, e, por sua vez, minimize as responsabilidades das escolhas políticas individuais, é uma visão que reconhece o impacto da corrupção nos direitos políticos. Como se discute neste artigo, ao se identificar óbices estruturais na competição político-partidária, em grande medida alimentados pela corrupção, transfere-se o problema da esfera de mera escolha política para o campo de direitos políticos, sobre os quais é natural a expectativa de atuação do Poder Judiciário.

Este trabalho explora a relação entre um campo dos direitos humanos -- os direitos civis e políticos, especificamente os direitos de (i) participar na direção dos assuntos públicos e (ii) de votar em eleições autênticas -- e a corrupção praticada por agentes públicos, partidos políticos e grandes empresas do setor de construção civil brasileiro em tempos recentes, tal como revelada pelas investigações da Operação Lava Jato. Argumenta-se que o Estado brasileiro falhou na garantia de tais direitos ao não impedir a disseminação de recursos ilegais nas eleições nacionais e locais ao longo das últimas décadas.