Empresas Estatais

INTEGRIDADE E TRANSPARÊNCIA DE EMPRESAS ESTATAIS NO BRASIL

Por Michael Freitas Mohallem, Beto Vasconcelos e Guilherme France.

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O enfrentamento da corrupção, com frequência, provoca uma percepção pública paradoxal – quanto maiores as revelações, maior a frustração popular com as instituições. Foi o que revelou a pesquisa “Retratos da Sociedade Brasileira”, que identificou a corrupção como o principal problema do Brasil para o ano de 2016, segundo 65% da população. De modo semelhante, o medidor internacional Corruption Perception Index, da Transparência Internacional, indica a piora da percepção sobre a corrupção no Brasil nos últimos cinco anos, ainda que esse pareça ser o período de mais intenso e efetivo desbaratamento de esquemas de corrupção em sua história.

As reações populares e institucionais recentes refletiram o sentimento difuso que se manifestou nos protestos recordistas de público. Nesse cenário conturbado que deriva da Operação Lava Jato encontram-se as empresas estatais brasileiras, especialmente a Petrobras. O fato de essas empresas – importantes referências à população brasileira – terem sido alvos de esquemas de corrupção criados ao longo das últimas décadas provocou impacto na sociedade brasileira. E, como desdobramento de diversas mudanças institucionais e legais ocorridas nas últimas décadas, serviu também de ponto de partida para o desenvolvimento de mecanismos de combate à corrupção desenhados especificamente para essas entidades. É com essa análise que este trabalho pretende contribuir.

A percepção de que as empresas estatais são alvo de excessiva influência política é permissiva na sociedade brasileira. Uma pesquisa realizada pela Ernst & Young revelou que 91% dos brasileiros acreditam que as empresas estatais são excessivamente influenciadas pela política. Esse não é um número que destoa entre os 24 países onde a pesquisa foi realizada. Apesar disso, 43% dos brasileiros acreditam que empresas estatais prestam serviços de forma melhor que empresas privadas, e “apenas” 60% defendem que empresas estatais são menos eficientes que as privadas. Esses números colocam os brasileiros entre os maiores defensores de empresas estatais.

Já o Congresso Nacional, a seu modo, procurou responder à percepção pública sobre a gravidade da corrupção com registros recordes de iniciativas legislativas de combate à corrupção. Apenas em 2015, mais de 140 proposições com foco anticorrupção foram apresentadas por deputados federais e senadores, especialmente direcionadas às regras de licitação, financiamento eleitoral, corrupção ativa e passiva e crimes contra a administração pública.

As empresas estatais brasileiras ocupam um espaço particular no imaginário popular e na história política e econômica brasileira. A Petrobras, especialmente, constitui um importante símbolo nacional, frequentemente relacionada ao potencial econômico nacional e à soberania do Brasil. Os processos de privatização que alcançaram determinados setores da economia ao longo da década de 1990 foram controversos, em parte, por causa de tais impressões. Dessa forma, a multiplicação de evidências cabais do envolvimento das empresas estatais brasileiras em escândalos de corrupção, principalmente a partir da Operação Lava Jato, teve um impacto definitivo na percepção da população sobre o nível de captura dessas entidades.

Este trabalho apresenta uma revisão geral da literatura sobre integridade e transparência em empresas estatais no Brasil, bem como da legislação nacional e de recomendações internacionais e domésticas sobre o tema. Não se pretende exaurir os temas, mas servir de ponto de partida para discussões mais profundas sobre os tópicos, os quais foram selecionados a partir de pesquisa bibliográfica e das reuniões realizadas com o Conselho Consultivo da Iniciativa de Integridade para Empresas Estatais. Assim, este trabalho está organizado da seguinte forma: inicialmente, são apresentadas as condições políticas particulares da realidade brasileira, as quais influenciam o funcionamento das empresas estatais e os constrangimentos permanentes às reformas pretendidas; em seguida, serão delineadas as principais características das empresas estatais brasileiras, com ênfase na estrutura institucional e no fundamental papel que exercem na economia nacional; posteriormente, serão discutidos em maiores detalhes os pontos considerados de maior relevância para a temática em análise: (i) governança; (ii) compliance e integridade; (iii) transparência; (iv) relações institucionais; e (v) controle interno.